Eu tive um sonho...
Há muito tempo esse sonho se repete...
Basta eu deitar, e antes de fechar os olhos
Já estou lá sonhando...
Sonho com um mundo repleto de poesia,
Um mundo que tem tanta poesia espalhada
Que os livros de poesia já não fazem mais sentido!
Vejo a poesia como o arroz e o feijão
Chegando à mesa de todos,
Pois todos precisam se alimentar de poesia.
Nesse meu sonho
Os poetas escrevem para pessoas,
E não para prêmios e críticos!
Os poetas olham as pessoas,
As entendem e usam seu dom
Para transformá-las de alguma maneira.
No meu sonho
Não existem poemas mainstream,
Só existem poemas personalizados,
Feitos exclusivamente para
Alguma pessoa, algum momento, alguma memória...
Ninguém mais precisa folhear calhamaços
Para escavar aquele soneto perfeito para si,
E que obviamente não foi feito para si...
No meu sonho
As namoradas não precisam ser humilhadas
Escutando seus amores declamarem versos
Compostos por outro para outra...
Não precisam se apaixonar por versos
Que idolatram musas como se fossem elas
Sem que nunca tenham sido.
Eu tive um sonho,
Um sonho em que os poetas entendessem
Sua função no universo:
Em que eles entendessem que sua busca
Alquimista pelo poema perfeito,
Pela fama artística,
Pelo olimpo imortal da academia,
Pelo louvor da crítica,
Pela notoriedade dos prêmios,
É absolutamente vã!
Que ser poeta é criar significados
Para a vida das pessoas...
De qualquer pessoa,
A qualquer hora:
Seja o príncipe da Inglaterra,
Ou o seu Manuel da Padaria...
Um milionário ou um suicida!
Todos, absolutamente todos,
Possuem poesia para os poetas se inspirarem.
Mas às vezes não encontram palavras para seus versos
E os poetas servem justamente para isso!
No meu sonho,
Os poetas têm muito talento:
Não querem um milhão de cópias,
Querem um milhão de originais.
Cada um deles exclusivo, diferente, customizado...
Não há diferenciação,
Eles querem mais e mais pessoas
Implorando por poemas...
E dão conta,
E sabem que seu idioma permite a criação
De um belíssimo poema para cada pessoa no mundo
Nas próximas 25 gerações!
Sonho
Que a língua seja infinita
Como o é a imaginação dos poetas!
Sonho
Que a torre inacessível de marfim
Onde os antigos poetas
Se isolavam no silêncio em a solidão
Seja substituída pela rua, pelo bar
E , sobretudo, pela internet!
Sonho
Um mundo onde os poetas
Possam ser achados a qualquer instante
E que a qualquer instante
Possam usar a pedra filosofal
De seus corações
Para transformar qualquer coisa em poesia.
E eles podem fazer disso um trabalho, uma fonte de renda,
Eles podem viver, sim, só de poesia
Porque a poesia da vida de cada um lhes sustenta.
No meu sonho,
As pessoas querem poemas
Para presentear,
Para eternizar casamentos, nascimentos, debutantes,
Para prestar homenagens a falecidos,
Para celebrar,
Para declarar seu amor eterno...
No meu sonho,
Poemas são complementos das fotos,
Só que capazes de perpassar
A superficialidade da matéria
E adentrar no recôndito das almas...
Só a combinação dos dois
Pode efetivamente retratar alguém .
No meu sonho,
Os poetas são imprescindíveis,
Tanto quanto os psicólogos e terapeutas!
Tanto quanto os médicos e dentistas!
Tanto quanto os operários e professores!
Todos os reconhecem,
Todos os admiram...
Mas dessa vez por lê-los e entendê-los ,
Mesmo que um único poema na vida...
Mas um poema só seu,
Com seu nome e sobrenome
Feito sob medida!
No meu sonho,
Os poetas querem ser entendidos.
Eles escrevem para serem lidos,
Escrevem com palavras humanas,
Abrem mão da arqueologia dos dicionários,
Escrevem sobre sentimentos humanos,
Abrem mão das idealizações ditas poéticas,
Escrevem sobre pessoas,
Abrem mão de personagens que metaforizam pessoas,
E, sobretudo, escrevem para pessoas,
Abrem mão da busca pela eternidade.
No meu sonho,
Os poemas são efêmeros como as pessoas...
Muitos deles terão a validade de um dia,
De um coração partido,
De um mudança de humor,
De um divórcio!
No meu sonho,
Só quem é capaz de tudo isso
Pode um dia ser chamado de poeta!
Hoje, eu não sou poeta,
Mas no meu sonho eu sou!
Eu quero compartilhar meu sonho com todos,
Pois sonhos sonhados em conjunto
Tem a mania de se tornarem realidade,
E, consequentemente, poesia!
